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terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Aula de Direito Constitucional - Direitos Fundamentais - Parte 2

3) DESTINATÁRIOS
Os direitos fundamentais surgiram tendo como destinatários (ou titulares) as pessoas naturais.

Com o passar dos tempos, os ordenamentos constitucionais passaram a reconhecer direitos fundamentais, também, às pessoas jurídicas.
Modernamente, as constituições asseguram, ainda, direitos fundamentais às pessoas estatais, isto é, o próprio Estado passou a ser considerado titular de direitos fundamentais. Aspecto importantíssimo
este, senão vejamos: os direitos fundamentais surgiram colocando o Estado “contra a parede”, na condição de réu, por meio da imposição de limitações à sua atuação; hoje, em certas situações, o próprio Estado pode ser titular de direitos fundamentais.

Não significa afirmar, porém, que todos os direitos fundamentais podem ser usufruídos por todos os titulares apontados acima (pessoas naturais, pessoas jurídicas e pessoas estatais).
Assim, na nossa Constituição Federal de 1988 temos direitos fundamentais igualmente voltados para as pessoas naturais, jurídicas e estatais (direito de propriedade, por exemplo – art. 5º, XXII); temos
direitos fundamentais extensíveis às pessoas naturais e às pessoas jurídicas (assistência jurídica gratuita e integral, por exemplo – art. 5º, LXXIV); temos direitos fundamentais exclusivamente voltados para a
pessoa natural (direito de locomoção, por exemplo – art. 5º, XV); temos direitos fundamentais restritos aos cidadãos (ação popular, por exemplo – art. 5º, LXXIII); temos direitos fundamentais voltados exclusivamente para a pessoa jurídica (direito de existência das associações, direitos fundamentais dos partidos políticos – art. 5º, XIX, e art. 17, respectivamente); direitos fundamentais voltados exclusivamente para o Estado (direito de requisição administrativa, por exemplo – art. 5º,
XXV).

4) POLO ATIVO E POLO PASSIVO
Conforme vimos, os direitos fundamentais nasceram como normas que impunham limitações à ingerência do Estado em favor da liberdade do indivíduo. Logo, no seu surgimento, os direitos fundamentais tinham o indivíduo no pólo ativo (como titular do direito) e o Estado no pólo passivo (como réu). Em verdade, ainda hoje a maioria dos direitos fundamentais tem essa mesma natureza: particular no pólo ativo e
Estado no pólo passivo.
Entretanto, com a evolução dos direitos fundamentais, poderemos ter, hoje, o Estado no pólo ativo (como titular do direito fundamental) e o particular no pólo passivo (como réu, como acontece quando é ajuizado
um habeas corpus contra ato de particular). Um bom dispositivo para ilustrar essa situação excepcional – Estado como titular do direito fundamental e particular no pólo passivo – é o direito de requisição administrativa, previsto no art. 5º, XXV, nos seguintes termos:

“Em caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano”
Nota-se, facilmente, que esse direito fundamental não foi outorgado ao indivíduo, mas sim ao Estado (em caso de iminente perigo público, o Estado, como titular do direito fundamental de requisição
administrativa, poderá usar gratuitamente de propriedade particular; o particular, na condição de pólo passivo, não poderá se opor ao uso, e somente fará jus à indenização se ulteriormente restar comprovada a ocorrência de dano decorrente desse uso).

5) NATUREZA RELATIVA
Não existem direitos fundamentais de natureza absoluta. Os bens constitucionais devem se usufruídos levando-se em conta, respeitando-se outros direitos também constitucionalmente protegidos.
Assim, nem mesmo o direito à vida é absoluto, haja vista que a própria Constituição Federal admite a pena de morte no caso de guerra declarada. Outros bens constitucionais (inviolabilidade das correspondências, de dados etc.) poderão ser afastados, se tais garantias estiverem sendo invocadas para acobertar práticas ilícitas (diante a prática de crime, seqüestro, por exemplo, poderão ser afastadas tais inviolabilidades, em homenagem ao direito à vida da vítima).

6) RESTRIÇÕES LEGAIS
Se os direitos fundamentais não possuem natureza absoluta, podem ter o seu exercício restringido por meio da expedição de atos legais (lei ordinária, lei complementar, lei delegada, medida provisória – de acordo com as exigências do texto constitucional).

Porém, esse poder da lei de restringir direito fundamental não é, por sua vez, um poder ilimitado. Ora, não é difícil perceber a razão para esse entendimento, para a existência dessa limitação: se a lei pudesse, de maneira ilimitada, impor restrições ao exercício de direitos previstos na Constituição, o legislador ordinário teria como afastar, fraudar a vontade do legislador constituinte (por meio da imposição de excessivas restrições, por lei, ao exercício do direito previsto na Constituição).

Nesse ponto – o poder da lei de impor restrições ao exercício de direitos previstos na Constituição não é um poder ilimitado – é que assume relevância o chamado princípio da razoabilidade/proporcionalidade.

O princípio da razoabilidade atua como limite que deverá ser observado pelas leis restritivas de direitos constitucionais. Assim, uma lei que imponha restrição ao exercício de direito previsto na Constituição só
será válida se obedecer ao princípio da razoabilidade.

E o que determina o princípio da razoabilidade? Quais são os seus comandos?
O princípio da razoabilidade reza que as restrições impostas a direito previsto na Constituição somente serão válidas se obedecerem, cumulativamente, aos seguintes requisitos: (a) necessidade; (b) adequação; (c) proporcionalidade em sentido estrito (equivalência entre meio e fim, entre a restrição imposta e o fim almejado).

Portanto, imposta uma restrição por lei a um direito previsto na Constituição, para sabermos se tal restrição é válida ou inválida, teremos que responder às seguintes indagações: (a) a imposição dessa
restrição é necessária, existe uma razão de interesse público que a justifique? (b) essa restrição é adequada para o alcance do fim almejado, para o objetivo pretendido? Será que ela produzirá,
efetivamente, os efeitos esperados? (c) será que há uma relativa equivalência entre a restrição imposta e o fim esperado? Será que não haveria outro meio menos gravoso para se atingir esse mesmo fim, uma
outra restrição menos gravosa ao indivíduo que produziria o mesmo resultado?

Caso a lei restritiva não atenda aos requisitos necessidade, adequação e proporcionalidade não será válida, devendo ser retirada do ordenamento jurídico por inconstitucionalidade, por desrespeito ao princípio da razoabilidade (o princípio da razoabilidade será melhor estudado na próxima aula, quando examinaremos os princípios constitucionais do art. 5º da CF).

Essa teoria, que impõe limites ao poder da lei de limitar direito previsto na Constituição, é denominada “limites dos limites” (os direitos previstos na Constituição não são ilimitados, podem sofrer limites impostos pela lei; porém, o poder da lei de impor limites aos direitos constitucionais também não é ilimitado, sofre limites impostos pelo princípio da razoabilidade – daí, “limites dos limites”, isto é, limites ao poder de limitar).

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